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Desplastificar a escola – um desafio necessário

Quando pensamos na curadoria dos espaços e dos recursos materiais da escola, levamos em consideração dois princípios: o da estética, relacionado ao direito à beleza e ao encantamento em ambientes convidativos e provocativos; e o princípio da ética, ligado a escolhas sustentáveis e que valorizem a coletividade.

Ter esses princípios como norteadores é um exercício de reflexão cotidiano para nós, educadores. As escolhas dos materiais e recursos que serão disponibilizados refletem a intencionalidade educativa que está por trás de cada objeto colocado na sala de referência, nas paredes ou no parque.

Uma das possíveis formas de contemplarmos a dimensão estética é por meio do encontro das crianças com o natural. Isso acontece quando estimulamos que brinquem, observem, sintam e convivam com a natureza e todo seu potencial formador.

A dimensão ética é desenvolvida, entre outras maneiras, quando nos perguntamos qual é o impacto que o material, brinquedo ou objeto que dispomos ao alcance da criança causa ao planeta.

Além das preocupações com escolhas sustentáveis, há também uma curadoria para o repertório sensorial que os materiais e recursos oferecerão para as crianças. O que os ambientes e os materiais contam da nossa proposta escolar?

Aqui na Escola AB Sabin, buscamos preparar espaços que comuniquem uma visão de criança e de infância baseada no respeito, na potência e na criatividade. Investimos em propostas que ajudem a criança a se sentir pertencente, que expressem um caminho singular de conquistas, sem estereótipos, que pouco contam sobre o mundo real. A escola deve ser um espaço de contraponto ao mundo descartável e frenético, e também um lugar de encantamento.

Na prática, pensar nas dimensões éticas e estéticas dos materiais e recursos implica menos massinha, mais argila; menos tintas plásticas, mais pigmentos naturais; menos brinquedos industrializados, mais brinquedos enriquecidos de materialidades como os de madeira, tecido ou outras texturas nobres. É ampliar o acervo de objetos não estruturados ou de largo alcance, que permitem que a criança invente a brincadeira ou crie novas formas e padrões, a fim de estimular o fazer imaginativo e colaborativo. Rolos de papelão de diferentes tamanhos e espessuras, caixas grandes, médias e pequenas, caixas de ovos, carretéis e cones de linha, tecidos de diferentes cores e texturas ou madeiras de diversos tamanhos e cortes (palitos, plaquinhas ou círculos) são exemplos de materiais não estruturados. Utensílios como escovas variadas, colheres, potes, funil, botões grandes, pincéis e buchas vegetais também oferecem ricas possibilidades. Enfim, as alternativas são muitas, principalmente no universo do reaproveitamento de itens domésticos e até mesmo, industriais.

Quando optamos por esses recursos, além de estimular a inventividade, partilhamos com as crianças a ideia de que a beleza pode estar nas coisas simples.

O deslocamento de visão de criança implica um deslocamento também de visão de escola e de currículo. Nossa prática visa a um percurso singular, que abra espaço para o fazer manual, criativo, inusitado, que fomente a investigação, a pesquisa, a subjetividade e a descoberta. Crianças que brincam com materiais menos industrializados e com recursos naturais desenvolvem maior capacidade de concentração e se sentem fortificadas por serem capazes de criar, movimento inverso do brinquedo pronto, que faz tudo por ela.

Desplastificar significa fazer escolhas que não limitem a experiência sensorial e estética, pois os materiais artificiais “artificializam”. Se a escola é um lugar para se descobrir o mundo, precisamos de elementos mais verdadeiros e que valorizem tal experiência.

Então quer dizer que agora está proibido brinquedo de plástico? Não é exatamente esse o recado que queremos dar. Pensar nas experiências táteis e estéticas implica ampliar a diversidade de materiais na escola. O que temos feito é uma movimentação cuidadosa e gradual, otimizando os recursos que já tínhamos, reaproveitando, das mais variadas formas, materiais plásticos, que têm alta durabilidade, e dando o destino correto a tudo aquilo que já pode ser descartado, por meio de parcerias com empresas especializadas em reciclagem. Desplastificar a escola é olhar para toda a cadência pedagógica, desde o planejamento, o preparo dos espaços, a seleção dos recursos, a experiência ativa da criança, os possíveis reúsos dos materiais e a avaliação das escolhas até a destinação correta ao final de cada ciclo didático.

As crianças são potencialmente inventivas e inovadoras. Vamos inovar como elas?

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