“A escrita da criança não resulta de simples cópia de um modelo externo, mas é um processo de construção pessoal.” (Emilia Ferreiro)
Emilia Ferreiro é uma psicóloga e pedagoga argentina que se dedicou a investigar os mecanismos pelos quais as crianças aprendem a ler e escrever.
Sob a orientação de Jean Piaget, que foi o precursor dos estudos sobre o desenvolvimento cognitivo infantil e desenvolveu a Teoria Psicogenética do Conhecimento, Emilia realizou seu doutorado em Genebra e, em parceria com a pedagoga espanhola Ana Teberosky, escreveu a obra Psicogênese da Língua Escrita, que retrata todo o processo investigativo em que esteve imersa.
Em função dessa pesquisa, o aluno antes avaliado negativamente por escrever de uma maneira que até então parecia sem sentido, passou a ser visto como um ser pensante, que desvela e constrói o sistema de escrita por meio dos problemas que encontra em seu percurso de escritor/leitor e das hipóteses que levanta para resolvê-los. A criança passa por etapas, com avanços e recuos, até se apossar do código linguístico e dominá-lo.
O impacto dessas ideias foi muito grande na educação brasileira, pois trouxe uma nova concepção sobre o sistema de ensino-aprendizagem da leitura e escrita, tornando-se uma referência teórica com relação à alfabetização a partir dos anos 1980.
Os estudos por ela realizados revolucionaram a forma de pensar a alfabetização, invertendo a lógica tradicional do ensino. O enfoque não era mais no ensino, tendo o professor como transmissor, mas sim na aprendizagem, garantindo ao aluno o papel de protagonista, como ser pensante, ativo. Desloca-se, assim, a ênfase do ensino para a aprendizagem, e as reflexões voltam-se a como a criança constrói suas hipóteses de escrita, de acordo com as situações que lhe são propostas.
É importante ressaltar que a obra de Ferreiro traz à luz uma teoria relacionada aos processos psicológicos da aprendizagem, com base nos aspectos cognitivos e interacionistas, voltada a como cada um aprende. Em nenhum momento, foi anunciada como método e jamais relacionada a sugestões de propostas didáticas de alfabetização.
Dentro dessa perspectiva, o papel do professor vai muito além de ensinar o ABC, cabe a ele ser mediador nos percursos de aprendizagem, na interação entre as crianças e no planejamento das situações problematizadoras que propiciem avanços na construção da base alfabética e do letramento.
Emilia Ferreiro é uma mulher que foi além de seu tempo. Por meio de sua pesquisa, abriu espaço para uma nova concepção do aprendizado da língua escrita. Trouxe um olhar generoso aos conhecimentos trazidos pelas crianças, saindo do julgamento de “o que ainda falta” e focando no que a criança já sabe, nas hipóteses que já construiu.
Trata-se de uma educadora que nos inspira, pois corrobora conceitos nos quais nossa escola se alicerça: a relevância do protagonismo das crianças, o respeito ao tempo e às individualidades, a força das trocas e das interações, o papel de um educador investigador, que exercita suas pesquisas cotidianas e, com olhar atento, planeja contextos para que práticas pedagógicas potentes promovam um ambiente rico em aprendizagem.